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Confesso uma coisa: há tempos estava cansada de filmes, documentários, livros e tudo mais sobre a Segunda Guerra Mundial. Não questiono a importância do tema, a gravidade do que aconteceu para muitos povos – as notícias costumam focar nos judeus, mas milhares de seres humanos sofreram perdas, maus tratos, misérias e injustiças inenarráveis naquele que é um dos períodos mais sombrios da história. Mas por muito tempo tudo recaia no mesmo e vamos perdendo o interesse.

Por isso, quando ouvi falar pela primeira vez do filme O jogo da imitação, não me ative a muito mais do que achar legal ver o ator de Sherlock da BBC (Benedict Cumberbatch), fazer cara feia porque não se cansam de fazer filmes ingleses com Keira Knightley e reconhecer “o irlandês” de Downton Abbey (Allen Leech).

Foi neste ponto que li a resenha de Lully sobre o filme. Ter uma amiga formada em Cinema faz a gente prestar atenção no que a pessoa diz sobre filmes!

A história é extraordinária, mesmo para quem acha que sabe muito daquele período.

O contexto do filme:

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O governo inglês estava perdendo a guerra e, em 1940, começou a procurar especialistas em uma área secreta: decifrar códigos. O objetivo era quebrar o Enigma, famoso código que os alemães usam para enviar mensagens aos submarinos.

Um de integrantes deste projeto ultra secreto e que por isso ficou “esquecido” por meio século foi Alan Turing (vivido por Benedict Cumberbatch), um matemático de 27 anos de inteligência lógica extraordinária e inteligência emocional e social bem abaixo da média. Por ser muito focado no trabalho e não entender as reações espontâneas das pessoas, ele tem problemas de relacionamento com praticamente todos à sua volta. Mesmo assim, apesar de sua intransigência, ele passa a liderar a equipe. Seu grande projeto é construir uma máquina que permita analisar todas as possibilidades de codificação do Enigma (que todo dia) em apenas 18 horas, de forma que os ingleses conheçam as ordens enviadas antes que elas sejam executadas. Entretanto, para que o projeto dê certo, Turing terá que aprender a trabalhar em equipe e tem Joan Clarke (Keira Knightley) sua grande incentivadora.

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Keira, sinceramente, está ela mesma: caras, bocas, trejeitos e aquela voz. Mas a personagem (baseada numa pessoa real) é um presente. Uma mulher à frente do seu tempo, formada em matemática e capaz de surpreender um cara como Turing, com quem estabelece uma relação afetiva muito especial. Ela o aceita como é, assim como aceita as regras dos pais que a querem casada, do governo que só aceita moças como secretárias e da universidade que não lhe ofereceu oportunidades depois de formada mesmo sendo brilhante. É daquelas mulheres que mudaram o mundo em revoluções silenciosas.

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Silencioso também é o sofrimento interior de Alan, homossexual desde jovem, mas que não pode se assumir sob o risco de ser considerado criminoso. Nem sei o que dizer ou pensar de um país que se considerava moderno e ditava regras para o mundo civilizado, mas, na metade do século XX, condenava criminalmente pessoas por sua orientação sexual.

Mas a história do matemático Alan Turing, pioneiro da moderna computação, responsável por quebrar o código do Enigma Alemão com sua equipe e adiantar significativamente o fim da Segunda Guerra Mundial é mais do que sua triste prisão interior por conta da orientação sexual proibida por lei – muito embora a gente saia do cinema pensando no quanto o matemático, lógico, criptoanalista e cientista da computação poderia ter feito pela humanidade se vivesse além dos 41 anos, idade com a qual se suicidou.

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O filme foi vagamente baseado no livro “Alan Turing: The Enigma”, de Andrew Hodges. Turing foi influente no desenvolvimento da ciência da computação e na formalização do conceito de algoritmo e computação com a máquina de Turing, desempenhando um papel importante na criação do computador moderno, além de ter sido pioneiro na inteligência artificial e na ciência da computação. Veja aqui os feitos dele, muitos dos quais, admito, não consigo entender!

O filme foi possível agora por diversos motivos – aliás teve uma disputa para decidir que estúdio faria o longa! – e creio que a principal foi uma campanha de internet que levou o primeiro-ministro britânico Gordon Brown a fazer, em 10 de setembro de 2009, um pedido oficial de desculpas público, em nome do governo britânico, devido à maneira pela qual Turing foi tratado após a guerra. Como as atividades dele eram secretas, ele não pode se defender adequadamente das acusações de atentado ao pudor, o que piorou seu caso e levou à condenação.

(Explicando com spoilers: tudo começou com um furto na casa dele, onde estavam guardados alguns documentos da época e ele não pode explicar o que fora furtado por seu amante ocasional”, o que levou ao caso de homossexualimo)

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Em 24 de dezembro de 2013, Alan Turing recebeu o perdão real da rainha Elisabeth II, da condenação por homossexualidade.

O Jogo da Imitação concorre ao Oscar nas categorias: melhor filme, ator (Benedict Cumberbatch), atriz coadjuvante (Keira Knightley), direção, edição, trilha sonora, design de produção e roteiro adaptado.

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Lully diz que não aposta no filme em nenhuma das 8 categorias pelas quais ele está indicado ao Oscar. “Não porque seja um filme que deixa a desejar, muito pelo contrário. Entretanto, vejo que os concorrentes são muito fortes, especialmente nas categorias de atuação. Tenho certeza de que será um daqueles filmes que não são premiados, mas que acabam alojados no nosso coração por muito tempo.”

Ficou no meu!

P.S. O filme não é recomendado para menores de 12 anos, mas eu vi com meus filhos (de 12 e 14) e todos gostamos.